A Vida Começa aos 60 sobre a visão de Américo Nouman Jr.
Por Américo Nouman Jr., Sacso Brasil
23/04/2025 13h25 - Atualizado em 23/04/2025 13h27
Apesar de alguns equívocos, a peça “A Vida Começa aos 60” entrega o que promete. Sem muitas pretensões, o texto do sempre competente Aguinaldo Silva cumpre seu papel: divertir e fazer pensar.
“A Vida Começa aos 60” mostra a improvável paixão do casal Lourdes (Luisa Tomé), viúva, rica e solitária aos sessenta anos e Amaro (Júlio Rocha), um homem mais jovem, também solitário e muito simples e os desdobramentos que essa relação causa em quem os cerca.
Com o etarismo apenas como pano de fundo, o espetáculo traz outras reflexões para assuntos da mesma relevância: ambição, intriga, ganância, paixão, inveja, amizade, honradez, amizade, fidelidade e, talvez o mal maior do momento, solidão.
Ainda que a peça cumpra o seu papel é importante destacar alguns pequenos defeitos da montagem.
Aguinaldo Silva, apesar do inegável talento e da capacidade de contar boas histórias erra na criação do personagem Amaro. Difícil, durante quase todo o espetáculo, entender o real caráter e os verdadeiros sentimentos do protagonista. O recurso de suscitar a dúvida no público é interessante e bastante usado em textos teatrais, no caso, porém, não é a dúvida que prevalece e sim uma confusão de interpretações. Apenas no quarto final de espetáculo é que a confusão é desfeita, mas não motivada pelo personagem e sim através de falas do dono do botequim (personagem pequeno, mas de grande importância), amigo de Amaro.
Outra falha perceptível, talvez proposital, é o não esclarecimento dos motivos porque sogra e nora (Glaura Lacerda) se odeiam. Talvez o propósito seja fazer com que cada um tire suas próprias conclusões com as pequenas dicas. De todo modo, não entendi a verdadeira razão do ódio entre ambas e espero que não seja apenas pelo clichê: sogra x nora. Clichês como outros dois, mas que não causam incômodo maior: o relacionamento entre um homem mais jovem e uma mulher mais velha e o relacionamento entre duas pessoas de classes sociais tão distintas. De resto, o texto agrada, diverte e segura a atenção com momentos realmente muito engraçados e atuações corretas.
Os maiores problemas, contudo, estão em alguns detalhes da direção (Maciel Silva) que, de alguma forma, fez as duas cenas mais importantes perderem a força. A cena em que sogra e nora lavam a roupa suja e a cena em que Amaro embriagado revela toda sua história de vida.
O personagem da vizinha (destaque para a atuação da atriz Natália Amaral) é a única que não troca o figurino durante a narrativa, se mantendo com a roupa da noite de réveillon. Além disso, há uma cena desnecessária entre Amaro e filho de Lourdes (feito pelo ator Tomás Vasconcelos), cena feita atrás de um biombo e que só ajuda a criar a tal confusão à qual me referi e responsável direta pela “barriga” do espetáculo.
O personagem do dono do botequim (Xico Garcia), amigo de Amaro que se torna um aliado de Lourdes também teve problemas. Em algumas cenas ele tem sotaque português (outro clichê) e em outras não se nota esse sotaque. A pergunta que fica é se há realmente necessidade de que o personagem tenha origem lusitana.
Há no espetáculo várias cenas de telefonemas e aqui também vi pequenos problemas. A boa intenção do diretor em dar cenas solo aos atores coadjuvantes (todos bem aproveitados) na prática não funcionou, com o interlocutor em cena fingindo que conversava com o outro que podia ser ouvido.
A falha mais grave, entretanto, talvez tenha ocorrido por questão de adaptação ao espaço cênico, mas que teria fácil solução. O cenário principal é o apartamento de Lourdes que tem uma entrada só, central. O que ocorre é que há portas laterais com cortinas de franjinhas e cada vez que os atores entravam em cena pela porta principal podia-se notar a passagem deles por essas portas laterais o que sempre acabava desviando a atenção do espectador. Isso poderia ser resolvido com a colocação de uma cortina de tecido mais grosso e escuro que em nada comprometeria a ação.
A “CASA - Centro Aguinaldo Silva de Artes” é simpática e confortável, apesar de um foyer tímido e apertado.
“A Vida Começa aos 60” apesar das pequenas falhas citadas é uma diversão interessante e que vale a pena conferir.
Por fim, importante salientar que Luisa Tomé foi uma boa escolha para o papel. Luisa Tomé é e sempre foi uma mulher bonita e representa bem a afirmação de que a vida começa aos 60.
“A Vida Começa aos 60” permanecerá em cartaz todo sábado (20h) e domingo (18h) até o dia 11/05 na “Casa Aguinaldo Silva de Artes” na Rua Major Sertório, 476 - Vila Buarque – São Paulo - SP